Audiência aponta importância de melhorar diagnóstico e acesso à informação no enfrentamento à Leishmaniose Visceral
O enfrentamento à leishmaniose visceral em Campo Grande foi tema de Audiência Pública, na manhã desta segunda-feira, na Câmara Municipal. A necessidade de ampliar as informações sobre a doença foi um dos pontos mais enfatizados. Também foi apontada a importância de criar um protocolo para melhorar o diagnóstico da leishmaniose em humanos, ampliando as chances de cura. Já o tratamento nos cães, evitando a eutanásia, foi outro ponto abordado, em relação aos esclarecimentos que precisam ser ampliados.
A audiência reuniu representantes de entidades que atuam na proteção animal, de órgãos do poder público que atuam pelo bem-estar animal, na saúde pública, além de representantes do Conselho Regional de Medicina Veterinária de Mato Grosso do Sul e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB de Mato Grosso do Sul.
O debate foi proposto pelo vereador Prof. André Luis, que integra a Comissão Permanente de Defesa, Bem-estar e Direito dos Animais, e ocorre no Agosto Verde, mês dedicado à conscientização sobre a leishmaniose. Inicialmente, o vereador fez uma apresentação falando sobre estudo e dados técnicos da doença. Ele recordou que o primeiro caso do Brasil foi registrado em 1907, na cidade em Corumbá, durante a construção da ferrovia. Lembrou ainda da confusão com outras doenças, além dos casos em que os cães não apresentam sintomas aparentes, apenas a falta de apetite, postergando a confirmação.
Outro tema abordado foi que a leishmaniose não é uma doença apenas de cachorro. Morcego, rato, gato e ser humano também podem ter. A leishmaniose é transmitida por meio da picada do mosquito flebotomíneo ao picar animais contaminados.
Ele apresentou ainda que a eutanásia não deve ser instrumento de controle da doença, como já demonstram estudos. É obrigação do proprietário, porém, realizar o tratamento no cão que for diagnosticado com a doença, podendo responder por crime de maus tratos. A vacina nos cães é um dos meios para evitar a leishmaniose, além de política de castração e uso moderado de inseticidas.
Participação – Laura Cristina, é da ONG Fiel Amigo, que abriga 300 animais, entre cães e gatos, além de 87 em lar temporários e 15 internados. Ela questiona por que os animais não têm direito a esse tratamento gratuito e citou que no abrigo tratam mais de 140 cães com leishmaniose. “Eles são portadores, mas fazem tratamento todos os dias e estão bem, cheios de vida”.
Já a protetora da ONG Abrigo dos Bichos, Maria Lúcia Metello, recordou de todo o processo para garantir o tratamento aos cães, desde uma nota pública até ação judicial contra as medidas que previam a eutanásia. “Entramos com ação, por meio do Prof. André, para derrubar portaria. Depois de 15 anos, conseguimos a sentença final recentemente, que podemos tratar. Muitas cidades ainda matam animais. Com conhecimento, vamos conscientizar que leishmaniose se trata”, afirmou.
A Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da Ordem dos Advogados do Brasil, de Mato Grosso do Sul, vem fazendo levantamento sobre o número de protetores em Campo Grande. O advogado Jayme Magalhães avalia que falta informação, pois criou-se uma ideia que o animal transmitiria para idoso, para pessoa, que corria risco. “Isso precisa ser mudado, essa interpretação”. Ele avalia ainda a necessidade de ampliar a política de castração.
Poder Público – A subsecretária do Bem-Estar Animal, Ana Luiza Lourenço de Oliveira Lima, falou de algumas ações realizadas para conscientizar a população, a exemplo de teatro nas escolas mostrando como agir em relação aos cães. Apresentou ainda o inseticida entregue à população e geral. Relatou ainda que mais de dois mil animais atendidos no mês passado, encaminhados para tratamento.
A coordenadora do Controle de Zoonoses (CCZ), Claudia Granja Macedo Mota Ferreira, salientou que a discussão é importante para assegurar tratamento de acordo com a realidade da população. Ela apresentou informações sobre projeto de encoleiramento de animais, nos bairros de transmissão mais intensa e vulneráveis, por meio de parceria com Ministério da Saúde, buscando redução de casos. “A doença ainda é negligenciada e precisa do apoio de todos. Sempre orientamos sobre o tratamento, mas a pessoa precisa acompanhar de perto e manter o tratamento mesmo quando reduzem alguns sintomas”, afirmou. No ano passado, o CCZ fez 10.982 coletas de sorologia em cães.
A leishmaniose visceral em humanos foi abordada por Camile Sanches, gerente estadual de zoonoses, representando a Secretaria Estadual de Saúde. Até julho 79 casos foram notificados em humanos e oito óbitos registrados, de crianças a idosos. “É um número que precisa ser lembrado. O tratamento não é fácil, tem muitos efeitos colaterais e gasto para s saúde pública”. Ela defende o olhar para essa doença com a chamada Saúde Única, para integrar as interfaces do relacionamento do animal, humano e ambiental. “Não tem como tratar sem essa integração. Diante de caso é feito controle no foco, testagem de outros animais. Nossa orientação é para que proprietário tenha conhecimento da possibilidade de tratar ou não animal”, afirmou.
Já a médica infectologista Silvia Uehara, que falou representando Ministério da Saúde, afirma que ainda há uma manutenção e aumento dos casos graves. “Queremos nos aproximar da saúde real, não em dados de papeis. Nos aproximamos dos conselhos, das audiências públicas, para fazer os investimentos do Ministério da Saúde virarem realidade”, afirmou. Uma das estratégias é ampliar as equipes de saúde da família, onde médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde irão atuar em conjunto. Ela destacou que o agente é importante para detectar vetores, casos de pessoas doentes e também de animais que apresentam sintomas. Conforme o médico Ronaldo Costa, superintendente estadual do Ministério da Saúde, haverá aumento de 146 equipes.
Ela informou ainda que no ano passado, 147 pessoas tiveram leishmaniose no Estado, com 12,5% de letalidade. A médica disse que dos casos que chegam ao Hospital Universitário, 50% apresentam inicialmente hipótese de dengue. Porém, ela salientou que depois de sete dias de febre a dengue já pode ser descartada. Em humanos, ainda é importante atenção a outros sintomas: emagrecimento, dor abdominal, aumento de baço e fígado. “Nestes casos, tem que testar e pensar em leishmaniose visceral”, disse. Ela lembrou da importância de os testes rápidos serem liberados a mais pessoas, citando que o Hospital Universitário precisa de mais testes.
O vereador Zé da Farmácia destacou que a Audiência foi rica em conhecimento. “São tantos animais soltos e falta essa informação”, afirmou. O vereador destacou o trabalho dos protetores, lembrando que também abriga em sua casa 60 gatos. “Abri mão do meu espaço em casa por conta dos meus gatos, temos todos os cuidados, com limpeza três vezes ao dia, vacinação. Esse preconceito precisa ser vencido”, disse.