Quer criar uma startup? Veja dicas e alertas de especialistas na área
O termo em inglês startup passou a ganhar visibilidade com a emergência de diversas empresas de tecnologia com exemplos de crescimento e transformação em grandes negócios. Em diversos casos, essas firmas começaram como startup e obtiveram alcance global, deixando esta designação, como é o caso de grandes plataformas digitais como Facebook, Google e Uber. O termo designa empresas com uma forte base tecnológica, que inovam, seja em seus modelos de negócio ou no serviço que ofertam a consumidores.
Apesar do nome ser vinculado a tecnologia, essas companhias atuam nos mais diversos campos, da agricultura ao mercado financeiro, passando pela educação e pela mobilidade urbana. Mas até que ponto as startups são uma alternativa para pessoas que querem empreender? A Agência Brasil conversou com especialistas e autoridades envolvidas no ecossistema desses negócios para colher dicas, recomendações e alertas.
Segundo dados da Associação Brasileira de Startups, (ABStartups), o Brasil possui mais de 13 mil startups distribuídas em 588 cidades, sendo 60% na região Sudeste. Essas são conduzidas por 10,1 mil empreendedores organizados em 74 “comunidades”. Conforme o levantamento Radiografia do Ecossistema Brasileiro de Startups, elaborado pela ABStartups em parceria com a consultoria Accenture, 42% têm até dois anos e 69% não ultrapassam R$ 50 mil de faturamento. Deste universo, 63% das firmas têm até cinco pessoas e 49% são compostas pelos sócios somente. Do total, 77% atuam voltadas ao mercado corporativo.
Definindo a ideia
A analista de inovação do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) Natália Bertussi destaca que no começo é fundamental a definição de qual problema o indivíduo ou grupo pretende resolver. “Uma vez que ela saiba isso, aí ela poderá pensar na solução mais adequada para resolver esse problema. Pode ser algo relacionado a alguma ‘dor’ que ela viveu, a um problema em sua cidade, um problema de determinado grupo da sociedade, etc”, explica.
Para o fundador da aceleradora de negócios 100 Open Startups, nesta fase inicial o interessado deve conseguir responder três perguntas: “quem sou eu, o que eu sei fazer e quem eu conheço?”. Ele chama a atenção de que mais do que uma ideia brilhante, é fundamental a pessoa entender que tipo de empreendedor ela é, o que ela consegue realizar e que rede ela consegue mobilizar, de fornecedores a consumidores. A partir daí, ele vai executando as ações e identificando os próximos desafios.
Formatando o negócio
Ao formular uma solução para um problema, o empreendedor precisa pensá-la como negócio, incluindo qual será o seu modelo, de que maneira vai comercializar o serviço ou produto, como e quem será remunerado na rede a ser formada e de que modo vai poder arcar com os custos de montagem e sustentação da firma.
O coordenador da incubadora do Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (Cefet RJ), Marcelo Alencar, alerta que um erro comum é o fato dessa dimensão não ser considerada desde o início. Uma vez que se trata de comercializar um bem ou serviço, a dimensão do modelo de negócios deve estar presente já desde a concepção. Um dos fatores que reforça esse problema é a ausência de conhecimento pelos empreendedores na área de gestão de empreendimentos.
“O primeiro embate é justamente como eu aplico meu conhecimento de forma que isso vire um negócio. O desafio seguinte é justamente vender. Quando se fala em comercializar, o jovem simplesmente não quer ouvir. Esse entrave se alonga em todo o desenvolvimento. Quando ele chega no final quando tem produto, ele tem a dificuldade de vender”, alerta.
O coordenador-geral de inovação do Ministério da Economia, Rafael Vandrei, ressalta que outro cuidado na hora da formatação do mercado é a pesquisa sobre o mercado onde pretende entrar e as startups já funcionando. Uma das formas é buscar as bases já construídas sobre o escossistema brasileiro, como os levantamentos da ABStartups (conheça as estatísticas e os estudos aqui – https://abstartups.com.br/pesquisas/).
“É muito importante que as pessoas interessadas em começar conheçam seus concorrentes. No início tem um número alto de casos em que a pessoa acordou com ideia e acha que só ela que formulou essa solução e vai fazer sucesso. Uma pesquisa não só no Brasil como fora pode poupar tempo para ele não investir se tem concorrente já atuando na área”, recomenda Vandrei.
Outra parte importante no estágio de formatação do negócio é a definição do público-alvo, ou o conjunto de pessoas, empresas, instituições e organizações com interesse potencial na solução proposta pelo empreendedor. “Você saber para quem você vai vender. A startup inicial ele escolher pra quem vai vender. Porque você pode ter boa ideia e direcionar teu esforço pro público errado”, pontua Marcelo Alencar.
Montando a equipe
Um outro momento fundamental é a montagem da equipe que irá trabalhar naquela companhia. Como apontado anteriormente, um percentual importante das startups tem sua força-de-trabalho composta dos próprios sócios.
O coordenador-geral de inovação do Ministério da Economia avalia ser importante ter no grupo responsável pela empreitada pessoas com formações e habilidades diversas de modo a fortalecer as competências da equipe e sua capacidade de dar conta dos desafios relacionados ao negócio.
“As startups de sucesso contam com uma pessoa ligada à área de tecnologia, mas necessariamente precisa haver uma multiplicidade de competências. Isso incluiria, por exemplo, alguém da área de gestão. Não vai só fazer a parte técnica, mas gerir a sua empresa e vender os serviços ofertados por ela. Essas competências são complementares”, frisou.
Marcelo Alencar, da incubadora do Cefet RJ, reforça a importância desta cautela. Segundo ele, muitas vezes não há na equipe alguém que pense no negócio, no dinheiro. “E isso causa outro problema, a pessoa idolatrar o produto que tem nas mãos, que se vende, que não precisa ter estratégia de vendas. Aquilo dali vai se vender sozinho, sem ter uma estratégia de negócio”, avalia.
Investimentos
Dentre as principais alternativas ela cita o Bootstrapping (financiamento com recursos próprios dos sócios), Money Love (que são principalmente amigos e familiares), Investidores Anjo (focado para startups pequenas e que precisam não apenas de recursos, mas de conexões e conselhos), crowdfunding (onde os recursos têm origem em pessoas físicas e são captados de forma coletiva) e o Venture Capital (geralmente investimentos maiores, em empresas um pouco mais maduras, com uma participação mais ativa do investidor).
Há, ainda, a possibilidade de buscar financiamento de Aceleradoras. “Aqui investe-se um valor, em troca de uma parte da empresa ainda em estágio inicial, apostando no crescimento rápido desta empresa. Além do investimento financeiro, também se dá um apoio de orientação mais ativa para facilitar esse crescimento”, acrescenta Bertussi.
Bruno Rondani observa que não adianta buscar investimentos se a pessoa não tiver recurso próprio e não fez nada. “Primeiro passo é fazer algo que possa ser demonstrado e aí atrair algum recurso. Este pequeno passo pode ser pequeno, questão de meses. Ele mostra que consegue criar impacto. Mobilizou pessoas, ou vendeu determinado produto ou serviço. A partir deste passo ele consegue algum tipo de aporte de entidade desconhecida”, sugere.
Programas
Não somente no caso do investimento, mas na formação, aconselhamento e facilitação de conexões há programas disponíveis para quem deseja buscar apoio com vistas a alavancar seu negócio. O Sebrae desenvolve uma série de iniciativas. As incubadoras e aceleradoras também são espaços importantes de equipes com experiência e que podem orientar interessados, desenvolvendo sugestões e alertas focados especificamente no negócio que o grupo quer desenvolver.
No plano federal, há também iniciativas. Uma delas se chama Inovativa, sob responsabilidade do Ministério da Economia. Conforme Rafael Vandrei, ela é centrada em capacitação e orientações, chamadas de “mentorias”, e em formas de conexão entre as startups e possíveis investidores ou compradores.
“A gente capacita elas em três meses. E temos bancas com investidores. Oferecemos oportunidades em que se a startup ficasse na sua cidade ela jamais teria apresentado a determinados investidores”, assinala. Mais de duas mil startups passaram pelo programa, e 926 foram apresentadas para investidores.
Outro programa é chamado Startout, voltado a empresas mais maduras e com intuito de se colocar no mercado internacional. Uma determinada quantidade de empreendedores é preparada e levada em missões em diferentes países para conhecer o ecossistema daquela nação e conversar com investidores.
“A gente capacita previamente. A partir daí também são colocados mentores locais, que conversam à distância sobre como é o ambiente de negócios lá. As empresas são preparadas sobre como se apresentar. As startups indicam se têm interesse em conversar com investidores e parceiros. Profissionais do programa fazem essa ligação, reuniões com investidores, espaços de inovação, aceleradoras para ver oportunidades de negócio”, relata.
De acordo com o representante do Ministério da Economia, o governo federal deve lançar um novo programa, que será chamado “Centelha”. O objetivo dele, acrescenta Vandrei, será atuar com empresas mais iniciantes. “Ele vai pegar pessoas saindo da universidade. Antes de pensar num Trabalho de Conclusão de Curso, vai incentivar a pensar num projeto de startup”, conta.
Obstáculos
Segundo o levantamento, as maiores dificuldades relatadas por startups ouvidas foram o engajamento dos consumidores (23%), marketing (13%), precificação e obtenção de receitas (11%), obtenção de financiamento (11%) e construção da tecnologia (9%).
Para Bruno Rondani, o sucesso na criação e crescimento de startups é “muito difícil”, o que é reforçado pelas estatísticas. Isso, contudo, não significa que a tentativa de empreender seja um caminho equivocado. Na opinião do fundador da 100 Open Startups, iniciativas deste tipo são saudáveis se encaradas como parte de um processo mais longo.
“O ato de empreender é bem-sucedido se a pessoa aprende e se desenvolve profissionalmente. O que é comum é a pessoa depois do ato de empreender sair melhor se ela tiver cabeça boa. Com isso ela pode inclusive conseguir montar um segundo empreendimento no futuro com mais conexões, com mais acesso a capital”, diz.
*Por Agência Brasil