O empresário Fahd Jamil, de 79 anos, vulgo ‘Rei da Fronteira’, vai deixar já nas próximas horas a sede da Garras (Delegacia de Repressão de Roubos a Bancos, Assaltos e Sequestros), em Campo Grande, e se mudar para um imóvel no centro da cidade onde irá responder aos seus quatro processos criminais pelo regime de prisão domiciliar.
O benefício foi concedido pelo juiz Roberto Ferreira Filho, da 1ª Vara Criminal de Campo Grande, diante da avaliação pericial que concluiu ser grave o quadro clínico do réu, que necessita de atendimento multidisciplinar, com acompanhamento de um enfermeiro diariamente (24h) e ainda fazendo o uso de medicamentos e até mesmo de oxigênio. Recentemente, ele passou por uma cirurgia de emergência no coração.
Além dos laudos médicos, consta na decisão judicial que a polícia foi favorável à remoção do acusado para um ambiente adequado. A Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) afirmou à Justiça que não há, atualmente, no sistema penitenciário e nem nas delegacias, estrutura de saúde que possa atender as necessidades do réu.
“Em casos como o do requerente, em que a prisão domiciliar é fundada em motivos de saúde, possuindo, assim, caráter humanitário, havendo deficiência do Estado em proporcionar atendimento médico adequado dentro do sistema prisional, não se justifica a manutenção do agente, sob pena de inegável ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana”, justificou o juiz em sua decisão, publicada na quarta-feira (02).
Apesar dos laudos em seu favor, para ser efetivamente ‘solto’, o empresário terá que pagar uma fiança milionária na ordem de R$ 990 mil, além de ter que fazer o uso obrigatório de uma tornozeleira eletrônica, entregar o passaporte, ser obrigado a morar no Centro da Capital e ainda não manter contato com réus e testemunhas na Operação Omertà.
“A monitoração eletrônica, como é cediço, é medida indispensável em casos que tais, até porque, por óbvio, prisão domiciliar é ‘prisão’, é restrição efetiva da liberdade da pessoa e, por isso, tal medida serve, justamente, para garantir que esta restrição seja respeitada”, explicou.
Sobre o valor da fiança, Roberto Filho apontou que Fahd informou, quando ouvido em sede de audiência de custódia, que possui ‘privilegiadíssima situação financeira’, com renda anual superior a R$ 2.000.000,00. “Tudo isso a justificar, ao meu ver, que o valor a ser fixado observe o disposto no artigo 325, II e § 1º, III, do CPP, e seja fixado em 900 salários mínimos”, determinou, negando ainda o confisco da mansão do empresário, em Ponta Porã, como garantia da fiança.
Em nota, os advogados Gustavo Badaró e André Borges disseram que a migração para a prisão domiciliar foi uma vitória. “Quanto ao tema da prisão domiciliar, a defesa de Fahd Jamil sempre confiou na atuação técnica e justa do Garras, Gaeco, IMOL e do Judiciário, todos tendo atuado de maneira eficiente e isenta para garantir direito previsto em lei, o que é muito positivo. Agora nosso cliente cuidará da saúde, ao lado da família e dos amigos, pessoas que nunca lhe faltaram, sem prejuízo de continuar à disposição das autoridades em geral e de se defender regularmente nos processos existentes”.
O caso
Fahd estava detido provisoriamente na sede do Garras desde o dia 19 de abril deste ano, quando optou por se entregar após ficar escondido por 10 meses na região de Ponta Porã, onde residia até então numa propriedade rural, juntamente com o seu filho, Flávio Correia Jamil Georges, que segue foragido.
Pai e filho são acusados pelo Ministério Público Estadual (MPMS) de integrarem organização criminosa que atuava em Ponta Porã e tinha parceria com o grupo criminoso que seria comandado pelos também empresários Jamil Name e Jamil Name Filho, em Campo Grande.
Ele também é réu pela morte do policial civil Anderson Celin Gonçalves da Silva e do servidor estadual apontado como pistoleiro, Alberto Aparecido Roberto Nogueira, o Betão, em 21 de abril de 2016, em Bela Vista.
A ligação entre as duas organizações foi apontada nas investigações da 3ª fase da operação Omertà. De acordo com denúncia apresentada em julho de 2020 e aceita pela Justiça, havia uma grande proximidade entre as duas supostas organizações criminosas.
Os grupos, teriam atuado conjuntamente, em pelo menos dois homicídios, o do pistoleiro Alberto Aparecido Roberto Nogueira, o Betão, e o do ex-chefe da segurança da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, Ilson Martins Figueiredo, o Figueiredo.
O MP-MS destaca na denúncia, que o grupo liderado por Fahd Jamil, não era o alvo inicial da investigação, mas sua atuação acabou sendo apurada também em razão dos crimes que ligam essa organização a chefiada por Jamil Name, mas precisamente na aquisição e transporte de armas de fogo de grosso calibre (fuzis) e na preparação e execução de homicídios, como o de Figueiredo.
A denúncia aponta que os dois chefes dos supostos grupos criminosos, Jamil Name e Fahd Jamil eram compadres. Destaca que a ligação entre as organizações ficou bem clara logo após a quebra do sigilo bancário de Jamil Name durante outras fases da operação Omertà, quando se constatou que ele pessoalmente ou por meio de sua esposa, fez oito transferências bancárias entre maio de 2016 e junho de 2019 para o filho de Fahd, Flávio Correia Jamil Georges, no montante de R$ 130 mil.
Fahd Jamil, que na denúncia do MP-MS chegou a ser chamado de “Rei da Fronteira” pelo suposto poder que tinha na região, sendo comparado pelos promotores do Ministério Público a um “padrinho da máfia representado nos filmes de gangster” está sendo acusado de integrar organização criminosa armada, corrupção ativa e tráfico de armas de fogo.
Seu filho foi denunciado pelos mesmos crimes e ainda por violação de sigilo funcional. Ele é acusado de ter obtido de policial federal, também denunciado neste processo, informações sigilosas para o grupo.