Brasil e Bolívia poderão ter ferrovia que cruzará a América do Sul
A integração ferroviária entre o Brasil e a Bolívia – que na prática concretiza uma rota sobre trilhos ligando os oceanos Atlântico (Santos) ao Pacífico (Iquique ou Arica, no Peru) – é viável e pode estar muito próxima de ser concluída. Reunidos em Campo Grande nesta sexta-feira (23.8), no Hotel DeVille, autoridades, gestores, técnicos e empresários dos dois países analisaram o projeto, apontaram os gargalos e pactuaram ações para superar as dificuldades listadas.
A Reunião para Integração Ferroviária entre Brasil e Bolívia trouxe a Campo Grande o ministro de Obras Públicas da Bolívia, Oscar Coca Antezana, o ministro João Carlos Parkinson, da Divisão Américas do Ministério das Relações Exteriores; o diretor de comercialização da YPFB (estatal petrolífera boliviana), Xavier Barriga; diretores do Ministério da Infraestrutura, da Agência Nacional de Transportes Terrestres, da Receita Federal, Polícia Federal, da Agesa (Armazéns Gerais Alfandegados de Mato Grosso do Sul), da Rumo Logística (concessionária da malha ferroviária Oeste), da boliviana Fosa (Ferroviária Oriental SA), empresários e profissionais interessados no assunto.
O governador Reinaldo Azambuja e o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), Jaime Verruck, representaram Mato Grosso do Sul no encontro. Azambuja listou como prioridade de seu governo formalizar a integração ferroviária, que passa pela revitalização de toda malha ferroviária desde Três Lagoas até Corumbá. Verruck chamou a atenção para a necessidade de facilitar os trâmites alfandegários para tornar o transporte de cargas competitivo. “O trem não pode parar na fronteira e esperar a burocracia decidir quando a viagem vai prosseguir”, afirmou.
Exatamente esse ponto dominou as discussões durante o encontro. O ministro boliviano, após apresentar um panorama das ações envidadas pelo governo de seu país para completar a malha férrea restante até chegar ao Pacífico, focou na necessidade de se estabelecer com urgência o que chamou de documentação antecipada, um sistema em que as notas da carga seguem antes, para dar agilidade ao transporte.
Outras medidas citadas foram a interligação digital entre as alfândegas brasileira e boliviana, a fiscalização dos vagões por scanners e aumento do efetivo de fiscalização nos dois lados da fronteira para desembaraçar as mercadorias. Bolívia e Peru já têm um acordo para desembaraço de mercadorias em que cada país aceita os trâmites do outro; a ideia é estabelecer algo parecido entre Brasil e Bolívia.
Infraestrutura e demanda
A demanda existe e tende a aumentar, afirmaram as autoridades brasileiras e bolivianas, o que foi corroborado pelo diretor executivo da Rumo Logística, Daniel Rossi. O Brasil importa fertilizantes da Bolívia e tem espaço para ampliar esse volume, que viria sobre trilhos. No caminho inverso, Mato Grosso do Sul tem grãos, celulose, minério para embarcar nos portos do Peru.
Para completar a malha férrea entre os dois oceanos resta um trecho de 200 quilômetros entre Santa Cruz de la Sierra, segundo o ministro Antezana, está em obras e fica pronto nos próximos anos, e mais 200 quilômetros de Cochabamba a La Paz que precisam ser revitalizados. Isso para acessar os portos do Peru, porque se o destino for Antofagasta (Chile), já existe em atividade um braço ferroviário partindo de Santa Cruz de la Sierra, fazendo conexão com a ferrovia argentina de Salta e daí, com a chilena.
A solução para a malha ferroviária brasileira já tem projeto, orçamento e proposta, segundo afiançou o diretor da Rumo Logística. O investimento necessário para refazer todo o traçado – desde Santos (SP) até Corumbá (MS), com troca de dormentes, trilhos, estações, é de R$ 3 bilhões. Mesmo valor deve ser investido na compra de locomotivas e vagões novos.
A Rumo Logística disse que apresentou ano passado ao governo brasileiro esse projeto, junto com a proposta de renovação do arrendamento da malha ferroviária, que vence em sete anos. A empresa está pronta para investir, desde que o governo aceite renovar a concessão. O prazo máximo para recuperar toda malha ferroviária Oeste seria de quatro anos, a partir do início das obras. Rossi destacou o apoio do governador Reinaldo Azambuja e do secretário Jaime Verruck, que têm feito gestões junto ao governo federal para viabilizar o acordo.