Audiência debate impactos da verticalização na qualidade de vida dos moradores e no desenvolvimento
Os impactos negativos e positivos da verticalização e nas novas construções na qualidade de vida em Campo Grande foram debatidos em Audiência Pública, na manhã desta sexta-feira (16). O debate foi presidido pelo vereador Prof. André Luis, presidente da Comissão Permanente de Mobilidade Urbana, e secretariado pelo vereador Zé da Farmácia. Arquitetos, advogados, representantes de construtoras e moradores da região do Chácara Cachoeira participaram da discussão, que envolveu aspectos legais, regras, impacto de vizinhança.
“Essa Audiência não esgota a discussão. Iremos trazer o debate para a Comissão de Mobilidade Urbana, pois os instrumentos da Lei de Ocupação do Solo e Plano Diretor precisam ser otimizados para atender a população”, afirmou o vereador Prof. André Luis. Em áreas residenciais, a exemplo do Chácara Cachoeira, há necessidade de planejamento para avaliar se haverá benefícios com as construções. O vereador citou a preocupação com os imóveis lindeiros, que podem até sofrer desvalorização.
“Precisamos gerar políticas para atender o que a maioria deseja”, ponderou o vereador Prof. André Luis. Ele lembrou que a verticalização, aparentemente, ocorre de maneira não ordenada e citou a necessidade de avaliar o efeito sinérgico, com impactos no trânsito, por exemplo. “Não temos aqui política de mobilidade urbana adequada”, afirmou, lembrando das constantes reclamações do transporte coletivo.
O juiz Marco Antônio Miranda Mendes falou representando os moradores do Chácara Cachoeira e defendendo o interesse primário, que representa o interesse da maioria da população. “Estamos preocupados com a verticalização desenfreada em bairros residenciais e priorizando o interesse de todos os cidadãos, alinhado ao direito da cidade sustentável com desenvolvimento urbano equilibrado e bem estar de todos os moradores. É necessário considerar se o arranha-céu atende fatores primários, como a qualidade de vida dos moradores e o meio ambiente”, disse.
Ele lembrou do Estatuto das Cidades e da necessidade de que todo projeto que impacte determinado bairro ser precedido de audiência pública. “Nossa resistência não é ao progresso, mas pela preservação do que é essencial para a qualidade de vida”, afirmou o juiz. Ele lembrou que o Chácara Cachoeira foi projetado para ser horizontal e defende que a qualidade de vida dos moradores deve ser protegida. Para ele, é necessário “rever o Plano Diretor de Campo Grande e limitar a verticalização em áreas residenciais”, afirmou.
Leis e zoneamento
O advogado Marcelo Bluma fez uma apresentação sobre as mudanças legais, instrumentos e normas de planejamento urbano, zoneamentos, e também as transformações na região do Chácara Cachoeira, que engloba ainda os bairros Miguel Couto e Cidade Jardim, por exemplo. O arquiteto Bruno Silva Ferreira explanou acerca das mudanças no Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Campo Grande, que possibilitaram a verticalização em zonas onde anteriormente não era permitido. Ele alerta que o traçado urbano planejado na região não permite a verticalização, por exemplo.
O arquiteto Ângelo Arruda lembrou que o Plano Diretor de Campo Grande é considerado exemplar porque integra meio ambiente e urbanismo. Também recordou aspectos históricos do planejamento urbano e do desenvolvimento da cidade, da implantação de shoppings, dos parques urbanos e de loteamentos fechados. O arquiteto falou de todo o trabalho feito para discutir a revisão que resultou no atual Plano Diretor, com audiências públicas promovidas pela prefeitura e pela Câmara Municipal envolvendo moradores de todas as regiões da cidade.
Arruda integrou a equipe técnica de pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul para debater essa nova norma. Ele não vê a verticalização como um problema, mas citou a quantidade de veículos por habitantes como exemplo de desafios de mobilidade. Ainda, citou que a Z3, estabelecida no Plano, não ‘liquida’ o Chácara Cachoeira, mas busca que a região começasse a adensar por ter 30% de vazios urbanos. “Ainda há espaços para edificar casas”, afirmou, recordando que a região possui 142 condomínios residenciais e 17 edifícios. O arquiteto avalia que a verticalização não é entrave para qualidade de vida.
Plano Diretor
As discussões envolveram vários apontamentos e detalhes sobre a Lei Complementar 341, de dezembro de 2018, que trata do Plano Diretor de Campo Grande e reflete diretamente nas regras que definem onde as construções podem ser realizadas.
Marcos Augusto Neto, ex-conselheiro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano, lembrou que ainda em 1988, antes da Constituição Federal e do Estatuto da Cidades, já existia o planejamento participativo. Ele alertou ainda que o Plano Diretor não pode ser facilmente alterado, pois envolveu ampla discussão durante 3 anos. “Não podemos fazer mudanças simplesmente alterando zoneamento porque há ritual tanto no Estatuto das Cidades quanto no próprio Plano determinando como ocorre essa revisão e que tipo de revisão pode ser feita”, pontuou. Para Marcos Neto, não há possibilidade de alteração na lei para que não ocorra interferências no processo participativo.
Desde 1988 podem ser construídos prédios em todos os bairros de Campo Grande, conforme alertou em sua declaração Geraldo Paiva, presidente do sindicato que representa as empresas de compra, venda, locação e administração de imóveis e edifícios em condomínios e residenciais de Campo Grande. Ele lembrou que o Plano Diretor aumentou a exigência de afastamento entre os edifícios, trazendo um conforto maior. “O Plano Diretor democratizou mais Campo Grande”, avalia Paiva, sobre a possibilidade de construções e atividades em todos os pontos da cidade, adotando providências diante de impactos causados. Para ele, o Plano aproximou o emprego das moradias. Ele questiona qual seria o direito do Chácara Cachoeira ou qualquer outro bairro em ter privilégio de se tornar uma “ilha”, sem permissão de construção de prédios.
Geraldo Mura, diretor imobiliário do Sindicato Intermunicipal da Indústria da Construção de Mato Grosso do Sul, afirmou que a construção civil segue o que está dentro da legalidade. “A gente compra a área, segue planeamento, aprova na prefeitura e isso leva, até construção do edifício, um prazo de 5 anos. Tudo é planejado e com antecedência”, disse. Ele afirmou que vê a verticalização como desenvolvimento, pois traz as pessoas para o Centro, auxilia na mobilidade urbana, no acesso à rede de esgoto, à escola e por ter tudo mais perto. “Quando você tem as pessoas mais próximas, estamos pensando no todo”, disse.
Estudos técnicos e transparência pautam o trabalho da Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano, segundo a diretora-presidente Berenice Maria Jacob Domingues. Ela falou da participação da sociedade no processo de planejamento, algo que vem sendo realizado. Ela recordou que 79 reuniões públicas foram feitas na discussão do Plano Diretor, perguntando aos moradores sobre a cidade que queremos. “Gostaria conclamar todos a participarem mais da construção e planejamento da nossa cidade. Temos fóruns permanentes de discussão. A cidade é nossa e o Poder Executivo precisa muito da participação de toda a sociedade para melhorar nossa performance e alcançar o desejo das pessoas”, disse.
Segurança jurídica
O advogado Vladimir Rossi Lourenço falou sobre a segurança jurídica e a legislação que está vigente. “As pessoas têm que ter a certeza que a consequência jurídica será aplicada e o poder público vai cumprir as normas. Isso é previsibilidade”, disse. Neste aspecto, o advogado acrescentou que o próprio Plano Diretor contempla a informação que foi elaborada tendo em vista os próximos 30 anos, contando com participação popular, e possibilitando revisão dentro de dez anos.
A advogada Fabiana Gonzalez, que integra a Academia Nacional de Direito Notarial e Registral, falou sobre a função social da propriedade. Ela questionou se o “interesse singular de alguns pode comprometer a paz social por meio de lei em vigor ou comprometer o Plano Diretor em vigor”.
Impactos
Andréia Figueiredo, diretora adjunta da Agência Municipal de Transporte e Trânsito, lembrou que o Chácara Cachoeira conta com vias importantes de passagem que interligam várias regiões da cidade. “Me preocupa mais que a verticalização, a taxa de motorização em Campo Grande. Estamos com as secretarias trabalhando na cidade para as pessoas, buscando inverter e melhorar acesso para pedestre, ciclista, transporte coletivo e, por fim, o transporte individual”, disse. Ela acrescentou que é feito estudo de impacto de vizinhança antes dos empreendimentos para que haja a responsabilidade de garantir melhorias no entorno das construções.
Valéria Gabas, superintendente regional do Grupo Plaenge, empresa que desenvolve projeto no Chácara Cachoeira, esclareceu que o grupo trabalha no mercado cumprindo a lei. “O projeto está em fase de estudo de impacto de vizinhança, atendendo todos os pré-requisitos da lei”, explicou. Ele falou da importância da segurança jurídica para os investimentos e disse que audiência pública foi feita pela Planurb para dar transparência para o investimento.
Ao final, moradores que estiveram presentes fizeram questionamentos sobre essas construções no Chácara Cachoeira e também apresentaram suas opiniões sobre o avanço das construções.