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No Dia Internacional dos Povos Indígenas, lideranças defendem mais visibilidade, moradia e educação

No Dia Internacional dos Povos Indígenas, o apelo de lideranças indígenas presentes em Audiência Pública, promovida pela Câmara Municipal de Campo Grande nesta quarta-feira, foi por mais visibilidade. Acesso à moradia, à educação, à saúde, à alimentação, valorização da cultura e da língua dos povos originários foram algumas das demandas apresentadas durante o debate com o tema Direitos Indígenas Urbanos.

A Audiência foi proposta pelo vereador Prof. André Luís, presidente da Comissão Especial das Causas Indígenas da Casa. A iniciativa da criação do colegiado, com reuniões mensais para que os indígenas possam apresentar suas demandas, foi bastante elogiada pelos presentes. O vereador salientou a importância da reflexão nesta data, na construção de políticas públicas, com as reais necessidades da população.  O vereador ainda citou a enfatizou a necessidade de representatividade. “Façam a política e ocupem os espaços. É preciso um movimento de união das etnias para serem representados”, afirmou. O vereador citou ainda que os indígenas precisariam estar a frente da Comissão.

A vereadora Luiza Ribeiro, vice-presidente da Comissão Especial das Causas Indígenas, que secretariou a Audiência, falou da importância de organizar políticas voltadas aos indígenas no âmbito municipal. “A Constituição determina tratamento especial a população originária. Avançamos bastante em várias lutas e precisamos avançar mais”, afirmou, citando a importância da criação do Ministério dos Povos Indígenas, pelo Governo Lula.

Números – Campo Grande conta com 18,4 mil indígenas, conforme Censo divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Em 2010, o levantamento apontava o número de 5,8 mil indígenas na Capital. Durante a Audiência, Sylvia Assad, coordenadora do Censo 2022, apontou algumas inovações feitas na coleta dessas estatísticas que podem ter impactado no número de pessoas que se autodeclararam indígenas, a exemplo de uma pergunta complementar feita durante o questionário nos locais com agrupamentos dos povos originários. Porém, também há o impacto demográfico, de pessoas que se mudaram de outros municípios, principalmente vindos do interior do Estado.

O Censo apontou ainda que Mato Grosso do Sul conta com 116 mil indígenas, sendo o terceiro Estado com maior população indígena do Brasil.  Sylvia Saad salientou a importância desses dados para que sejam planejadas políticas públicas voltadas para atender toda a população. Dados sobre infraestrutura destes agrupamentos indígenas também constam no levantamento. O superintendente estadual do IBGE, Mário Alexandre de Pinna Frazeto, falou também sobre o trabalho de especialistas para coletar os dados, das parcerias para os levantamentos especiais, chegando aos dados que podem resultar na construção de propostas para proporcionar melhoria da qualidade de vida da população.

Lutas – O líder indígena Aguinaldo Terena, conselheiro do Conselho Municipal de Direitos e Defesa dos Povos Indígenas e Diretor Cultural da organização Fórum dos Caciques de Mato Grosso do Sul, cobrou que as políticas públicas não podem ficar só no papel, precisam ser efetivadas. “Nos falta moradia, educação e saúde dignas. A juventude tem que ter incentivo ao esporte, à valorização da cultura e da língua para não sermos dizimados”, disse.

“A invisibilidade dos Guarani Kaiowá é muito presente e causa muita revolta”, como declarou Luciane Gallo, liderança Guarani Kaiowá. Ela abordou a luta na região sul do Estado, mas reclama que, muitas vezes, são considerados apenas os indígenas nas reservas, sem falar do indígena no contexto urbano. “A Constituição Federal não está delimitada ao local de moradia, mas em todos os locais que ocupamos espaço”, disse. Ela abordou a importância da educação respeitando a língua materna e da cultura respeitando o modo de ser, além de citar a necessidade de profissionais que compreendam o povo indígena.

Silvio Kaiowá, representante do Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena de Mato Grosso do Sul, também falou da luta por direitos e reclamou que “nos tornaram estrangeiros em nosso próprio país, o território dos povos originário”. Ele considera que há uma dívida do Estado Brasileiro com o povo originário. “Queremos o direito de sermos respeitados. Não se mata um povo só com tiro no peito. Se mata tirando seu direito, soberania, sua cultura, sua oportunidade de exercer seu direito na sociedade”, disse. Ele anunciou ainda a volta do polo base da Sesai (Secretaria de Saúde Indígena) em Campo Grande, para humanizar atendimento, por meio de parceria entre Município, Estado e universidades.

As lutas dos indígenas por direitos básicos também foram abordadas pela defensora pública dos Direitos Humanos, Danielle Osório. Ela lembrou que é o grupo com menores indicadores sociais, constantemente vilipendiado, constantemente com direitos negados. Ela lembrou ainda que Campo Grande foi fundada em cima de território Terena e falou da problemática do racismo estrutural em nosso País. “A população Terena nos procura para demandas simples, como moradia, saneamento básico e alimentação. Os indígenas são hoje as famílias com maior insegurança alimentar”, afirmou, lembrando que as demandas são pilares da existência humana. Ela reforçou a importância de as legislações contemplarem os indígenas.

O pedido por moradia também foi ressaltado por Luciana da Silva, vice-cacique da Aldeia Água Funda, localizada no Jardim Noroeste, em Campo Grande. “Em todas as oportunidades, vamos pedir apoio em relação à moradia, porque a partir daí teremos saúde e educação. Queremos moradia digna! Estamos há seis anos caminhando, mas queremos contar com a solidariedade de todos para sermos ouvidos”, disse.

O presidente da Associação dos Trabalhadores Indígenas, José Pacheco, falou da necessidade de gerar renda e emprego para a população indígena, além de moradia, saúde e educação. “Precisamos melhorar a qualidade de vida qualificando o trabalhador”, disse. Ele sugere que as empresas que recebem incentivos fiscais contratarem indígenas e façam essa qualificação.

Políticas públicas – Diante dos resultados do Censo, apontando maior presença da população indígena, Fernando de Souza, subsecretário de Políticas Públicas para Povos Originários de Mato Grosso do Sul,  destacou como esses dados “impõem uma nova responsabilidade para os entes federados; um olhar mais refinado com esse público”. Neste aspecto, ele ressaltou a importância da iniciativa da Câmara Municipal, com a proposição da Audiência Pública e também a criação da Comissão Especial das Causas Indígenas, com reuniões mensais. “Temos que trazer para a pauta a qualidade de vida, a dignidade e a cidadania para os povos indígenas. É uma luta nossa”, disse, ressaltando a importância de os indígenas serem protagonistas nas discussões.

O professor Elciney Paiz Flores, da Coordenadoria de Modalidades Específicas da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul, falou sobre o curso Normal Médio Intercultural Indígena, sendo ofertado em Campo Grande na Escola Estadual Hércules Maymone, oferecendo essa qualificação para indígenas em contexto urbano. Ele citou a participação de vários indígenas como professores e coordenador no curso, que conta com três módulos e uma matriz curricular elaborada com base na realidade dos indígenas.